Fui convidada para escrever sobre o tema do mês: amor. Sou uma pessoa que pensa de forma muito objetiva e confesso que fiquei confusa. Amor? Quando? Onde? Pelo que, de que tipo, oi? É um tema tão amplo que pode ir para tantos lugares, sobre o que eu deveria escrever?

Comecei então a pensar em tudo que envolve dedicação emocional da minha parte como, por exemplo, aceitar esse convite, mesmo estando perdida no tema e no tipo de escrita, já que posso amar fazer parte disso no futuro. Afinal, amo papel, amo caneta, amo até o Word e a antiga máquina de escrever e, com certeza, amo escrever (ou talvez, a ideia de um dia conseguir escrever bem). Também pensei sobre o amor ao direito, minha área de formação. Pensei sobre o amor à música, filmes, objetos, lugares e momentos que carregam para mim uma história afetiva por detrás. Claro, também me veio a mente o mais óbvio - nesse momento quem está lendo deve estar se perguntando se sou tão materialista a ponto de não incluir essa parte - o amor por pessoas que passaram ou ainda estão passando pela minha vida. Dentro de cada um desses tipos de amor existem tantas histórias, tantas possibilidades e desdobramentos, que permaneci na dúvida: sobre o que, então, devo escrever?

Enquanto quebrava a cabeça lembrei que o amor ao papel e caneta envolve a liberdade e leveza de que ninguém está lhe vendo, ninguém precisa saber com quais palavras se iniciou o processo, e que se eu simplesmente quebrasse o gelo e começasse a escrever qualquer coisa, até mesmo sobre estar em dúvida quanto a escrever ou não, a única pessoa que existiria para me julgar nesse contexto seria eu mesma. Confesso, também, que essa tal de “eu mesma” é um ser muito crítico com a minha pessoa e esse julgamento pode ser duro, mas hoje aos 27 anos aprendi a me enfrentar... bem, não com relação a tudo, mas estamos evoluindo e nesse caso já estou menos submissa a essa julgadora dentro de mim. 

Então decidi: que escreva! Se ficar ruim eu rasgo, jogo fora, ninguém mais precisa saber, mas ao menos preciso mostrar para aquela “eu mesma” que eu ia tentar. É o mínimo, precisamos enfrentar esse monstrinho dentro das nossas cabeças, carregado de orgulho, que morre de medo de errar e diz: se não for bom, não põe para fora, não seja ridícula! Quer saber, precisamos ser ridículas as vezes, mais ridículas até do que já imaginamos que somos, só assim chegamos a boas conclusões, explorando tudo que der e quiser, até mesmo o ridículo. Enfim me enfrento e decido que posso viver com a minha consciência se “eu mesma” descobrir que é uma ideia ridícula e que não estou indo para lugar nenhum ao começar essa avalanche de pensamentos sem ninguém ver. Afinal, o que pode dar errado?

Tudo bem, e quando vamos voltar a falar de amor? Bom, nessa confusão mental, percebi a relação desse meu “drama” recém descrito com o amor (falei que era um tema muito amplo). Independente do tipo de amor, esse sentimento envolve algo grande, abrangendo um risco de decepção que pode se concretizar ou não. Isso por que o amor vem carregado de expectativas, idealizações, por vezes alguns extremos e a realidade dificilmente acompanha a imagem que nossa mente cria, e afinal, como poderia? Seja no amor por alguém, por um hobby, por sua profissão, a realidade sempre vai causar algum tipo de decepção, mesmo que mínima, se compararmos ao que esperávamos da imagem idealizada daquele objeto que criamos ao nos apaixonar.

A escrita... como disse no início, eu a amo, mas será que eu de fato amo escrever ou amo o que acho que poderia um dia escrever? Amo o sucesso de um texto que ainda não se concretizou? Se amo escrever e me frustro por não conseguir escrever de pronto o que gostaria, ou ainda, se tenho medo de começar um brainstorm por receio de julgamento prévio, é certo que essa frustração surge de uma idealização do objeto que digo amar. O que estou amando não é real, no geral as pessoas jogam muito texto no lixo e palavras ao vento antes da concretização de algo que as agrade. Temos que nos conscientizar disso, mas de verdade, não basta saber.

 Não basta saber que a princípio nos apaixonamos por alguém e depois que a paixão acaba o que resta é o amor, é preciso de fato aceitar e compreender o que isso significa. Devemos nos conscientizar a ponto de aprender que isso não se restringe ao amor romântico e nem mesmo ao amor entre pessoas. Uma expectativa que você cria na vida, e para sua vida no futuro, está relacionada a uma visão sua de um quadro que você pintou mentalmente e essa pintura pode não sair igual e nem melhor do que foi imaginado. Devemos criar consciência disso a ponto de aceitar que a ideia é ideia e provavelmente vai ser diferente da realidade. Gera decepção? Claro! Mas não é por isso que tudo acabou, que o que ficou ou o que virá é ruim, que o objeto do amor era em si uma decepção. A decepção é sua e só sua, você a criou de início, você foi quem idealizou algo e ignorou que a realidade só sai da sua própria mente nos seus sonhos. 

O que fazer então? Bem, acredito que o primeiro passo seria aceitar isso e enfrentar esse fato da vida. A ideia seria justamente aceitar e abraçar essa decepção, ela faz parte do processo, daquela parte esperançosa da sua mente que você não consegue controlar, mas sabe do que se trata. Sabendo que não passam de expectativas suas, e ultrapassando a inevitável decepção, podemos tentar ver o objeto que amamos em si, com seus erros, com falhas e até meio feio, enfrentar essa realidade: amo isso mesmo assim? Invisto nisso mesmo assim? Ou seja, eu só amo de verdade se amo também as imperfeições, enxergando tudo.

Assim, no amor entre pessoas passo da paixão e enxergo um ser humano comum, que irrita, que é absolutamente imperfeito, mas com quem ainda quero construir uma relação e manter na minha vida. Já eu, com a minha escrita, esqueço o sonho de infância de que em um só rompante de genialidade eu poderia me transformar em Shakespeare e aceito pegar uma folha em branco e escrever qualquer coisa, seja ela idiota, ridícula, rasa ou sem nexo, por que descubro que eu realmente amo escrever e na minha realidade isso envolve ser ridícula 99% do processo e ponto final. Afinal, eu ainda nem sei do que estou escrevendo! Devo me obrigar a superar essa decepção e aceitar que amor é isso, é, entre outras coisas, felicidade, satisfação, plenitude e muita, mas muita, frustração e decepção, tudo junto e misturado, mas mesmo assim é o que faz tudo no fim valer a pena.

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